Em busca de uma vida melhor

    Publicado por:  Gustavo Leandro de Siqueira Prestini

Nancy Elizabeth Suarez, 44 anos, nasceu em Buenos Aires, capital da Argentina, e é casada com Roberto, mais conhecido como Gringo, nascido em Posadas, na província de Misiones, também localizada no país platino. Eles, que eram donos de uma loja em Buenos Aires, vieram para o Brasil há 11 anos, para escapar da crise que se estabeleceu na época em seu país natal. Roberto já conhecia Curitiba, de uma viagem de férias que fez quando tinha 15 anos. Vieram com seus quatro filhos e aqui, anos depois, tiveram mais um bebê, que está agora com quatro anos. “Una aventura”, como ela diz, que deu certo. No momento, eles aguardam o prazo legal para pedir a naturalização brasileira e aí poder fazer algumas coisas que como estrangeiros não podem, como votar, por exemplo. Nancy trabalha aqui na Escola Erasmo no setor de limpeza e conta como é sua vida aqui em Curitiba, se se adaptou bem em nosso país e se pretende voltar para a Argentina um dia. Não estranhem perceber uma ou outra palavrinha do espanhol  espalhada por aí. É assim mesmo que a Nancy fala.

 
Jornal Empep: Você e a sua família adaptaram-se facilmente ao Brasil?
 
Nancy: A família toda ficou na Argentina, mas elem vêm muito pra aqui, sempre tem gente de lá aqui, minha sogra estava aqui até a semana passada. Pero, a gente se acostumou porque fizemos muitos amigos, lá não tínhamos amigos. A gente daqui é muito boa, é muito fácil fazer amizade aqui, as pessoas convidam para um café... foi bem fácil de nos acostumar. Eu e minha família não nos acostumaríamos novamente se voltássemos para a Argentina. Quando meu marido fala em voltar, digo que não volto. Aqui tenho dois filhos casados com brasileiros, não volto.
 
JE: E aquela famosa rixa entre o Brasil e a Argentina?
 
Nancy: Ah, é só no futebol, a gente dá risada. Como meu marido sempre diz: a gente nunca sofreu discriminação.
 
JE: E o trabalho, você gosta de seu trabalho aqui na escola?
 
Nancy: Gosto, é tranquilo, sossegado,estou sendo bem tratada.
 
JE: E de crianças, você gosta?
 
Nancy: Gosto, claro. Tive cinco, né? (Risos) E agora tenho dois netos.
 
JE: Em qual idioma você e sua família se comunicam em casa?
 
Nancy: Só espanhol, ou seja, o castelhano. Porque depois de um tempo percebemos que estávamos esquecendo algunas
palavras. Então resolvemos em casa só falar espanhol.
 
JE: E para os pequenos, como fica isso de falar espanhol no Brasil?
 
Nancy: Quando viemos para cá meu filho menor tinha dois anos, não falava nem português nem espanhol. Aprendeu aqui as duas línguas. O menor agora, de quatro anos, pode estar falando comigo em espanhol e se virar e falar com você em português... ele sabe diferenciar.
 
JE: Você já voltou para a Argentina depois de ter se mudado para o Brasil?
 
Nancy: Já voltei várias vezes. Há cada dois ou três anos a gente vai à Argentina nas férias. Agora faz uns quatro anos que não vou lá.
 
JE: E você sente falta de sua família, dos amigos?
 
Nancy: Da família eu sinto, sim. Amigos, tenho mesmo é aqui.
 
JE: Você está inteirada da política atual da Argentina?
 
Nancy: Minha filha conseguiu sintonizar a rádio Mitre da Argentina pela internet, e eu gosto de ficar ouvindo rádio enquanto faço o
serviço de casa. E aí a gente se informa do que acontece lá, não? Fiquei sabendo que lá faz cinco dias que não tem luz, um apagón. E os parentes também reclamam um pouco, dos preços altos, salários baixos... fazem panelaço para que a presidenta não se reeleja.
 
JE: Você costuma preparar os pratos típicos da Argentina na sua casa?
 
Nancy: Sim, sempre, todo dia eu faço um prato argentino! Lá em casa não se come arroz e feijão... Uma vez por mês meu marido
pede: “faz um feijão”, aí eu faço porque meu marido gosta. Meus filhos casados sabem que podem ir lá em casa quando querem comer uma comida argentina porque sempre tem.
 
JE: E quais as comidas típicas da Argentina que você gosta?
 
Nancy: Empanada, Locro, que é como se fosse uma feijoada, mas em vez do feijão a gente usa milho branco; Milanesa com Papas fritas, Bolita de fraile ...
 
JE: Sua família, seus filhos... eles querem voltar para a argentina?
 
Nancy: Non, só de férias, visitar todo mundo. Curitiba é muito bom para se viver.
 
JE: E a música e outras coisas da cultura, você sente falta?
 
Nancy: É bom que tem internet agora. Nos domingos, meu marido acorda cedo e coloca as músicas folclóricas argentinas, e passamos o dia todo ouvindo música de lá. Então...
 
JE: E o futebol? Vocês tem time aqui?
 
Nancy: Meu marido torce pelo Atlético aqui, lá pelo River Plate. Eu não gosto, mas se jogam Brasil e Argentina, eu torço pela Argentina, colocamos bandeira, soltamos foguete, não tem problema, todo mundo sabe que a gente é de lá.
 
JE: Você diz que gosta muito daqui, que não volta mais pra lá, mas, o que tem de bom lá que não tem aqui?
 
Nancy: Eu sofri muito no começo por causa das comidas, a carne, por exemplo, é diferente, lá é muito macia, aqui não, lá nem
se usa panela de pressão, não precisa. Mas já me acostumei. Mas tem um costume nosso que não quero que tirem porque é muito bonito. Os argentinos homens: pais, filhos, amigos se beijam quando se encontram. Meu marido beija seus amigos, é um gesto de carinho, de quem se gosta. Um dia destes, na oficina, um colega de meu marido foi cumprimentá-lo e lhe deu um beijo no rosto. Todo mundo ficou assombrado. Mas alguém disse: “ele não é gay, é argentino”.
 
Redação: Alunos Samuel Ortega e Raquel Franco, e Prof. Luciane Heleno

*Reportagem originalmente publicada no Jornal Mural EMPEP. Edição 002, Novembro/Dezembro 2012. O Jornal Empep é um projeto que utiliza conceitos de Educomunicação para o desenvolvimento educacional e cidadão dos alunos.

 

Autor: Prof. Erasmo Pilotto, EM | Fonte: Jornal EMPEP
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